Justiça mantém bloqueio de R$ 4 mi de Riva e Maggi
As defesas de José Riva e Blairo Maggi solicitaram a reconsideração pelo magistrado da decisão que recebeu a denúncia do Ministério Público e autorizou a indisponibilidade de bens
O juiz da Vara Especializada em Ação Civil Pública e Popular, Luis Aparecido Bortolussi Júnior, negou no dia 22 de fevereiro pedido do ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Blairo Maggi (PP) e do ex-deputado estadual José Riva (sem partido) e manteve bloqueado o patrimônio de ambos por suspeita de improbidade administrativa na ordem de até R$ 4 milhões.
Em ação civil pública de autoria do Ministério Público Estadual (MPE), Maggi e Riva são acusados de participação na compra de uma vaga de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE), que visava a substituição de Alencar Soares por Sérgio Ricardo, este último afastado do cargo por força de liminar.
Ainda seguem com o patrimônio bloqueado os ex-conselheiros do TCE Humberto Bosaipo, Alencar Soares e seu filho Leandro Soares, o ex-secretário de Estado Eder Moraes Dias, o empresário Gércio Marcelino Mendonça Júnior, conhecido como Júnior Mendonça, e o ex-governador Silval Barbosa (PMDB).
As defesas de José Riva e Blairo Maggi solicitaram a reconsideração pelo magistrado da decisão que recebeu a denúncia do Ministério Público e autorizou a indisponibilidade de bens.
Porém, a decisão cita que não houve nenhuma mudança dos fatos e tampouco de valor jurídico que possa alterar a questão processual.
O juiz Luis Aparecido Bortolussi ainda anulou decisão dada em 15 de fevereiro que reconheceu a existência de conexão da ação de improbidade com a ação civil pública anteriormente ajuizada pelo Ministério Público e determinou a reunião dos processos para julgamento conjunto.
De acordo com o magistrado, embora tenham causa de pedir mediata (remota) idêntica (suposto esquema para compra de vaga de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso), possuem diversidade de objeto e de causa de pedir imediata, de modo que tal medida poderá prejudicar o princípio da razoável duração do processo e a efetividade da prestação jurisdicional, dada a extensa dilação probatória necessária à resolução das demandas.
Íntegra da decisão:
Atendendo pedido formulado pelo réu Sérgio Ricardo de Almeida, a MMa. Juíza de Direito em Substituição Legal, durante licença compensatória deste titular, reconhecendo a existência de conexão desta ação de improbidade com a ação civil pública anteriormente ajuizada pelo MP, determinou a reunião dos processos para julgamento conjunto (Ref. 212)
Ao rejeitar a alegação de incompetência deste Juízo, suscitada pelo réu, a MMª. Juíza enfatizou que ambas as ações foram distribuídas a este Juízo e que a sua intervenção inicial, quando negou o afastamento pretendido na primeira ação, ocorreu apenas em razão de sua substituição ao juiz titular.
No entanto, a despeito de rejeitar o pedido de incompetência do juízo, frisando ter atuado apenas em substituição, afastando a equivocada alegação de prevenção, entendeu a magistrada que ambas as ações deveriam ser reunidas para julgamento conjunto por este Juízo.
No caso, o pedido de incompetência deste Juiz de Direito formulado pelo réu Sérgio Ricardo de Almeida ocorreu em 24.01.2017, após a decisão que determinou o seu afastamento do cargo de Conselheiro no Tribunal de Contas, cuja decisão, por ele agravada, teve indeferido o pedido de suspensão dos seus efeitos pelo E. Des. Luis Carlos da Costa, da E. Primeira Câmara de Direito Público.
Note-se que em nenhum momento anterior ocorreu ao réu alegar a incompetência deste Juízo; não o fez na defesa preliminar desta ação, primeira oportunidade que teve de pronunciar-se; somente depois da decisão de afastamento e após a negativa de suspensão dos efeitos da decisão pelo Tribunal de Justiça é que o réu Sérgio Ricardo de Almeida endereçou o referido pedido à Nobre Magistrada.
Pois bem.
A reunião de processos para julgamento conjunto é medida que há de ser examinada em cada caso concreto, tendo em conta a natureza, o objeto, a causa de pedir, a fase processual e as peculiaridades de cada ação judicial, tarefa que, de ordinário, deve ser adotada pelo Juiz de Direito Titular competente, ou seja, aquele que se supõe, logicamente, conhecer melhor os autos do que o substituto que, regra geral, intervém pontualmente no feito e que, provavelmente, não julgará tais ações.
Esse tipo de pedido, por isso mesmo, não é daqueles normalmente decididos em períodos de substituição, já que a não reunião de processos conexos não gera risco aos interesses das partes se as ações não estão aptas para julgamento conjunto, notadamente se não se demonstrou a fase em que estão as ações, de modo a aferir risco iminente de decisões contraditórias.
Observa-se que os autos da Ação Civil Pública n.º 59697-55.2014.811.0041 (Id 949052) foi distribuída no dia 18/12/2014 e esta Ação Civil por Ato de Improbidade Administrativa nº 59959-05.2014.811.0041 (Id. 949403) no dia 19/12/2014; a primeira ação encontra-se em fase de saneamento, enquanto que a segunda, após notificação preliminar e respostas dos réus, foi proferida decisão de admissibilidade da ação em face dos Réus, no bojo da qual se decretou a indisponibilidade de bens e o afastamento do Réu Sérgio Ricardo de Almeida do cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso (09/01/2017 – Ref: 156), encontrando-se, atualmente, em fase de citação dos Réus.
Ressalte-se que só se pode cogitar de reunião obrigatória de processos, por conexão, quando se esteja diante de concorrência entre dois ou mais Juízos, em princípio, igualmente competentes, coisa que aqui não ocorre, porque, em verdade, cuida-se de Vara Única em que a MMª. Juíza atua apenas em substituição legal nos processos presididos por este Juiz Titular.
“A reunião das ações propostas em separado far-se-á no juízo prevento, onde serão decididas simultaneamente”, prescreve o art. 58 do CPC. A prevenção entre os Juízos ocorre com o registro ou distribuição, preceitua o parágrafo único do referido dispositivo.
A finalidade de evitar decisões inconciliáveis ou contraditórias, que se obtém com a reunião dos processos, supõe a existência de duas ou mais ações entre Juízos diversos, em princípio competentes e, no caso em exame, ambas as ações tramitam perante esta mesma Vara Especializada e sob a presidência do mesmo magistrado. Por isso o CPC enuncia, no seu art. 54, que “a competência relativa poderá modificar-se pela conexão ou continência”. (grifei), o que não é o caso.
Além disso, não há conexão entre a ACP anterior e a presente Ação de Improbidade Administrativa, já que, embora haja similaridade entre elas, não há identidade de objeto entre as demandas, conforme o regramento da lei que disciplina esta última ação (Ação de Improbidade).
A Lei nº 8.429/92 possui norma especifica e mais rigorosa que a regra geral do CPC sobre a conexão e a prevenção, exigindo identidade de objeto e causa de pedir entre as ações, denotando a atenção do legislador para as peculiaridades dessa sui generis ação punitiva (Ação de Improbidade Administrativa), tutora dos mais essenciais princípios e valores constitucionais.
Com efeito, o art. 17, º 5º da lei nº 8.429/92 estabelece:
“A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto”.
A vis atrativa que a ação de improbidade exerce em relação às futuras ações estritamente conexas evidencia a preocupação do legislador em restringir a simultânea tramitação de processos que não guardem relação de prejudicialidade com ela, em atenção ao rito especial que a caracteriza, com o que se afasta a cumulação de ações que, embora com ela possam ter algum ponto de contato, podem ser julgadas separadamente.
Assim, se só ações posteriores que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto previnem a jurisdição, com mais dose de razão não se deve cogitar de reunião de outras ações ajuizadas antes da ação de improbidade, como se dá no presente caso.
A doutrina tem enfatizado a natureza especialíssima da ação de improbidade. Por sua clareza, transcrevo conciso artigo do Procurador do Estado de Minas Gerais Thiago de Oliveira Soares:
“A ação de improbidade administrativa, disciplinada no artigo 17 da Lei 8.429/92, tem seu assento no art. 37, § 4º da Constituição da República, sendo manifesto seu caráter repressivo, já que se destina, precipuamente, a aplicar sanções de natureza pessoal, semelhantes às penais, aos responsáveis por atos de improbidade administrativa, conforme prevê o art. 12 da referida Lei.
Por outro lado, através da ação de ressarcimento de danos ao erário, busca-se a anulação de atos danosos ao erário, com o respectivo pedido de reparação, que pode ser promovida pelo Ministério Público com base no art. 129, III da Constituição. Essa ação tem por objeto apenas sanções civis comuns, desconstitutivas e reparatórias.
Essa distinção foi enfatizada no julgamento do REsp 827.445, perante a 1ª Turma (DJ de 08.03.10), quando, em voto-vista, o então ministro do STJ, Teori Zavaski, registrou que, diferentemente do que ocorre com simples demandas anulatórias de ato jurídico ou de reparação de danos, “a ação de improbidade administrativa tem natureza especialíssima, qualificada pelo singularidade do seu objeto, que é o de aplicar penalidades a administradores ímprobos e a outras pessoas – físicas ou jurídicas – que com eles se acumpliciam para atuar contra a Administração ou que se beneficiam com o ato de improbidade”.
Portanto, trata-se de uma ação de caráter repressivo, semelhante à ação penal, diferente das outras ações com matriz constitucional, como a Ação Popular (CF, art.5º, LXXIII, disciplinada na Lei 4.717/65), cujo objeto típico é de natureza essencialmente desconstitutiva (anulação de atos administrativos ilegítimos) e a Ação Civil Pública para a tutela do patrimônio público (CF, art. 129, III e Lei 7.347/85), cujo objeto típico é de natureza preventiva, desconstitutiva ou reparatória.
Na ação de improbidade o objeto principal é aplicar sanções punitivas de caráter pessoal, a saber: a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, a multa civil e aproibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios.
O excelentíssimo ministro destacou, ainda, que “a perda de bens, a suspensão de direitos e a multa são penas que têm, do ponto de vista substancial, absoluta identidade com as decorrentes de ilícitos penais, conforme se pode ver do art. 5.º,XLVI da Constituição. A suspensão dos direitos políticos é, por força da Constituição, conseqüência natural da “condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos” (art. 15, III). Também é efeito secundário da condenação criminal a perda “do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso” (CP, art. 91, II, b). A perda de “cargo, função pública ou mandato eletivo” é, igualmente, efeito secundário da condenação criminal, nos casos previstos no art. 92, I, do Código Penal: “quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a administração pública” e “quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a quatro anos, nos demais casos”.
A instauração de inquérito civil, no âmbito do qual se produz a prova necessária para a ação de improbidade, é o procedimento padrão e normal em casos da espécie, conforme fazem certo os artigos 14, § 3º e 15 da Lei n.º 8.429/92. Nem por isso, todavia, proposta a ação, fica o juiz dispensado de promover o juízo de delibação para recebimento da inicial, precedido da notificação prévia do demandado para se manifestar a respeito, conforme exige o art. 17, §§ 7º, 8º e 9º. Aliás, mesmo que se considerasse dispensável a notificação, ainda assim seria indispensável, porque é ato processual típico da natureza desse rito especial, o juízo de delibação propriamente dito.
Dessa forma, importante destacar que, embora as sanções por improbidade (art. 37, § 4º, da CR/88) tenham natureza político-civil e não propriamente penal, há vários pontos de identidade entre as duas espécies, seja quanto à sua função (que é punitiva e com finalidade pedagógica e intimidatória, visando a inibir novas infrações), seja quanto ao conteúdo. Com efeito, não há qualquer diferença entre a perda da função pública ou a suspensão dos direitos políticos ou a imposição de multa pecuniária, quando decorrente de ilícito penal e de ilícito administrativo. Nos dois casos, as conseqüências práticas em relação ao condenado serão absolutamente idênticas. A rigor, a única diferença se situa em plano puramente jurídico, relacionado com efeitos da condenação em face de futuras infrações: a condenação criminal, ao contrário da não-criminal, produz as consequências próprias do antecedente e da perda da primariedade, que podem redundar em futuro agravamento de penas ou, indiretamente, em aplicação de pena privativa de liberdade (CP, arts. 59; 61, I; 63; 77,I; 83, I; 110; 155, § 2.º e 171, § 1.º). Quanto ao mais, entretanto, não há diferença entre uma e outra. Somente a pena privativa de liberdade é genuinamente criminal, por ser cabível unicamente em casos de infração penal.
Ora, foi justamente essa substancial semelhança entre as sanções penais e as da improbidade administrativa que determinou, no âmbito civil, a formatação de um procedimento típico e inovador: a introdução, nas ações de improbidade, da fase procedimental relacionada com a admissibilidade da demanda, prevista nos §§ 6º a11 do art. 17 da Lei 8.429/92. A preocupação do legislador, quanto ao ponto, foi adequar o processo civil à finalidade, que não lhe é peculiar, de ser instrumento para imposição de penalidades ontologicamente semelhantes às das infrações penais. À identidade material das penas veio juntar-se a identidade formal dos mecanismos de sua aplicação. Foi no Código de Processo Penal, com efeito, que o legislador civil se inspirou para formatar o novo instrumento: o procedimento da ação de improbidade é em tudo semelhante ao que rege o processo e julgamento dos crimes de responsabilidade dos funcionários públicos, previsto nos arts. 513 a 518 do CPP.
Destarte, somente se pode considerar como típica ação de improbidade aquelas que contenham algum pedido de aplicação de sanções político-civis, de caráter punitivo. Ações ajuizadas que visem simplesmente pleitear a anulação de atos danosos ao erário e de ressarcimento de danos deverão ser discutidas através de ação popular, ação civil pública ou mesmo pelo procedimento comum ordinário – ações de ressarcimento de danos. Como bem destacado pelo Ministro Teori Zavascki,” ressarcir danos não constitui propriamente uma punição ao infrator, mas, sim, uma medida de satisfação ao lesado, e a ação de improbidade destina-se prioritariamente a aplicar penalidades e não a recompor patrimônios".
Assim, o pedido de ressarcimento de danos, na ação de improbidade típica, não passa de um pedido acessório, necessariamente cumulado com pedido de aplicação de pelo menos uma das sanções punitivas cominadas ao ilícito. O reconhecimento da obrigação de ressarcir danos, sob esse aspecto, é espécie de efeito secundário necessário da punição pelo ato de improbidade.
Portanto, delineadas as peculiaridades das ações de improbidade administrativa, não se deve confundi-la com outras querelas discutidas em juízo. Um dos pontos centrais e característicos das ações de improbidade administrativa é a existência de rito próprio de processamento, descrito pela Lei n.º 8.429/92 – que prevê um juízo de delibação para recebimento da petição inicial (art. 17, §§ 8º e 9º), precedido de notificação do demandado (art. 17, § 7º), etc. – só pode ser aplicado às ações típicas dessa natureza, sob pena do reconhecimento da nulidade procedimental. (Precedentes: REsp 1163643/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/03/2010, DJe 30/03/2010).”
O Egrégio Superior Tribunal de Justiça, em recente julgamento de sua Colenda Primeira Turma, no REsp 1540354/PR, em que foi relatora a Min. Regina Helena Costa, DJ 27.05.2016, acentuando essa especialíssima natureza da ação de improbidade, em caso análogo, afastou a conexão, no seguintes termos:
“RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL. AÇÕES CIVIS PÚBLICAS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. "OPERAÇÃO LAVA JATO". DISTRIBUIÇÃO POR PREVENÇÃO. CRITÉRIO. ART. 17, § 5º DA LEI N. 8.429/92 (MESMA CAUSA DE PEDIR OU MESMO OBJETO). PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. REGRAS GERAIS PREVISTAS NOS ARTS. 103 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL/1973 E 76 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. NÃO APLICAÇÃO. OBSERVÂNCIA DO JUIZ NATURAL.
I - Na apreciação da temática envolvendo conexão de ações e prevenção de Juízo, deve-se ter em conta o princípio do juiz natural (art. 5º, XXXVII e LIII, da CR/88), que assegura a todos processo e julgamento perante juiz independente e imparcial, com competência prévia e objetivamente estabelecida no texto constitucional e na legislação pertinente, vedados os juízos ou tribunais de exceção.
II - A Lei n. 8.429/92 (Lei de improbidade Administrativa - LIA), bem como a Lei 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública - LACP), em suas redações originais, não continham norma específica acerca de prevenção e de conexão, sendo aplicado, nas ações de improbidade administrativa, supletiva e subsidiariamente, por força do art. 19 da LACP, o disposto nos arts. 105 e 103 do Código de Processo Civil/1973.
III - Com a Medida Provisória n. 2.180-35/2001, vigente por força da Emenda Constitucional n. 32/2001, as Leis ns. 8.429/92 e 7.347/85 passaram a contar com previsão expressa a respeito, respectivamente nos arts. 17, § 5º e 2º, parágrafo único, cuja aplicação, pelo princípio da especialidade, afasta a incidência das normas gerais, previstas nos arts. 103 do Códigos de Processo Civil/1973 e 76 do Código de Processo Penal.
IV - Embora a redação seja semelhante, impende reconhecer, sob pena de concluir-se pela inutilidade da alteração legislativa efetuada, que os critérios configuradores da conexão entre ações de improbidade administrativa, aptos a determinar prevenção de Juízo, nos termos do art. 17, § 5º da LIA (mesma causa de pedir ou mesmo objeto), são mais rígidos que os previstos na regra geral do art. 103 do Código de Processo Civil/1973.
V - Não se configurando a mesma causa de pedir nem o mesmo objeto entre as ações de improbidade administrativa, não incide a regra de prevenção prevista no art. 17, § 5º, da LIA, impondo-se a livre distribuição por sorteio entre os Juízos competentes.
VI- Recurso especial desprovido.”
Observa-se que, enquanto na Ação Civil Pública n.º 59697-55.2014.811.0041 (Id. 949052), promovida em face do réu Sérgio Ricardo de Almeida, Estado de Mato Grosso, Assembleia Legislativa e Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso, o Ministério Público Estadual pretende a anulação de todo o procedimento que resultou na nomeação e posse do réu Sérgio Ricardo de Almeida no cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, na Ação Civil por Ato de Improbidade Administrativa (Id. 949403) proposta em face daquele Réu e de outros 07 (sete) cidadãos, o autor pretende a aplicação das diversas sanções próprias da Lei nº 8.429/92, pretensão que está a exigir ampla averiguação de fatos acerca das condutas que lhes são imputadas e, inclusive, da intencionalidade dos seus atos.
Para que se tenha clara a ausência de prejudicialidade que informa o instituto da conexão, ainda que todos os pedidos formulados na ação de improbidade viessem a ser considerados improcedentes, essa circunstância não impediria que os atos impugnados na Ação Civil Pública anterior (Id. 949052) pudessem ser anulados por ilicitude. A decretação da ilicitude daqueles atos, por sua vez, não conduziria, necessariamente, à procedência da Ação de Improbidade (Id. 949403).
No caso vertente, embora ambos os feitos tenham a mesma causa de pedir mediata (suposto esquema para compra de vaga de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso), existe diversidade de objeto e causa de pedir imediata entre as demandas, o que afasta eventual conexão e a necessidade de reunião dos feitos.
Consoante ensina Carlos Alberto de Salles:
“(...) Diversamente da hipótese anterior, a resposta aqui deve ser negativa. A declaração de nulidade deve ser considerada como pedido autônomo, isto é, não dependente do reconhecimento da improbidade administrativa. Justifica-se esse ponto de vista, pois, como indicado acima, a nulidade pode não estar vinculada a uma improbidade, não afastando tal circunstância o interesse e legitimidade na invalidação do ato. A regularidade dos atos administrativos deve ser considerada como pretensão separada, pois constitui um valor em si, diverso da probidade e constituindo diversa causa de pedir. Em uma Administração Pública crescentemente processualizada como a contemporânea, os atos administrativos não apenas deve ser probos, mas também regulares (...)”. (Revista Justitia, São Paulo, 66 (200), jan./jun. 2009. Interesses Difusos e Coletivos: Peculiaridades do Objeto do Processo de Improbidade Administrativa. pp. 365/378)."
Ademais, reputo inconveniente a reunião das referidas ações, pois embora tenham causa de pedir mediata (remota) idêntica (suposto esquema para compra de vaga de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso), possuem diversidade de objeto e de causa de pedir imediata, de modo que tal medida poderá prejudicar o princípio da razoável duração do processo e a efetividade da prestação jurisdicional, dada a extensa dilação probatória necessária à resolução das demandas.
Oportuna a transcrição de ementa de julgado oriundo do egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, a respaldar o entendimento ora adotado:
“AÇÃO DE IMPROBIDADE. PREFEITO. AUSÊNCIA DE CONEXÃO ENTRE PEDIDO DECLARATÓRIO DE IMPROBIDADE E PEDIDOS DECLARATÓRIO DE NULIDADE OU CONSTITUTIVO DE ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO.
A cumulação de pedidos previstos na Lei nº 8.429/92 e de outros que lhe são estranhos, com pretensão de cognição principaliter, aqueles submetidos à competência originária do Tribunal, estes, à sua competência recursal, atrai, analogicamente, a hipótese da Súm. nº 170 do eg. STJ, impondo a cisão, que deve ser determinada pela Corte, sob pena de se ferir o princípio da ampla defesa e o do art. 292, § 2º do CPC, bem como de praticar atos absolutamente nulos.
A mera afinidade não é causa de prorrogação de competência, exigindo-se que o mesmo julgador seja competente para a apreciação de todas as demandas cumulativas, a fim de permitir-se a reunião das mesmas. E a possibilidade de modificação, ocorrente na conexão, não se estende à competência funcional, que é de ordem absoluta.
O que atrai a competência para esta Vigésima Segunda Câmara Cível é o julgamento do Prefeito ou do ex-Prefeito enquanto pessoas naturais, decidindo-se sobre o ato atacado apenas incidenter tantum. A ação declaratória ou desconstitutiva de um ato da municipalidade, onde esta deve ser ré, juntamente com os demais partícipes, não condiciona a ação de improbidade, pois que se exigem presentes outros requisitos além da ilegalidade do ato para a declaração da improbidade.
(...)
HIPÓTESE DE CISÃO EM RELAÇÃO AO PEDIDO CUMULADO, E DE SUSPENSÃO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA CONTRA O PREFEITO.
(...) (TJRS - Vigésima Segunda Câmara Cível, Apelação Cível nº 70007069966, Rel. Desa. Rejane Maria Dias de Castro Bins, j. 07.10.2003, v.u.)" (negrito/grifo nosso)
Dada à propriedade com que tratou o tema, peço vênia para transcrever trecho do voto exarado pela Rel. Desa. Rejane Maria Dias de Castro Bins ao julgar o recurso supramencionado:
(...)
Impõe-se a decisão sobre a possibilidade de cisão das demandas movidas pelo Ministério Público, quando cumulado pedido constitutivo ou declaratório com respeito ao ato praticado.
Não se trata, assim, de a questão estar colocada como fundamento do pedido, pelo que seria apreciada nos motivos da decisão, mas sim de se postar como objeto do próprio pedido, exigindo uma cognição dita principaliter e não incidenter tantum. Nesta, é possível haja pronunciamentos discrepantes; naquela, não. Trata-se, por exemplo, do pedido de declaração da prática de atos de improbidade em relação a um agente público, com a correspondente condenação, cumulativamente com a declaração de invalidade do ato atacado, ou de sua anulabilidade. Tanto em ações desconstitutivas como naquelas meramente declaratórias é possível ocorrer o tipo de pedido que demanda o litisconsórcio unitário.
Mas, então, não se estará diante da presença do Prefeito ou do ex-Prefeito enquanto pessoa física, mas sim do ente público em nome de quem o ato foi praticado por aquele, na qualidade de representante. Impõe-se reunir todos os participantes do ato atacado enquanto referidos ao próprio ato cuja desconstituição ou declaração de nulidade se postula, ex nunc ou ex tunc respectivamente.
Como o que atrai a competência para esta Vigésima Segunda Câmara Cível é o julgamento do Prefeito ou do ex-Prefeito enquanto pessoas naturais, inviável se mostra a cumulação desses pedidos. Na ação de improbidade, decidir-se-á sobre o ato atacado apenas incidenter tantum.
A propósito, na dicção de CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO (in Litisconsórcio. SP, Malheiros, 1997, 5ª ed. rev. e atual., p. 136), “Quando a relação incindível estiver simplesmente alegada entre os fundamentos do pedido, e assim destinada a ser objeto de exame entre os motivos da sentença, essa incindibilidade não será determinante da unitariedade litisconsorcial”. E acrescenta: “Em tese é possível a ocorrência de manifestações discrepantes sobre a relação incindível conhecida incidenter tantum, sem criação dos graves impasses práticos de que se fala (...)”.
Ao decidir sobre a prática de ato de improbidade pelo agente político, não necessariamente se há de julgar o ato praticado. Certo, se ele for inválido ou anulável, será condenado o Prefeito ou o ex-Prefeito, se se conjugarem os elementos da responsabilidade subjetiva. Assemelha-se a hipótese à da suspensão do processo cível, pela ação penal, consoante art. 64 do Código de Processo Penal: “Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, a ação para ressarcimento do dano poderá ser proposta no juízo cível, contra o autor do crime e, se for caso, contra o responsável civil. Parágrafo único - Intentada a ação penal, o juiz da ação civil poderá suspender o curso desta, até o julgamento definitivo daquela”. Mas trata-se de uma faculdade, de sorte que poderá haver decisão civil independente da criminal, ainda que versem a mesma conduta do réu.
Já a ação declaratória ou desconstitutiva de um ato administrativo ou político-administrativo não poderá condicionar a ação de improbidade, senão quando presentes outros requisitos, valendo apenas quanto ao próprio ato apreciado em sua legalidade. Tem-se reiteradamente afirmado que conduta ilegal não é sinônimo de conduta ímproba. Insta ressaltar, ainda, que, mesmo declarado ilegal o ato, pode não ocorrer prejuízo ao Erário, se, por exemplo, tratar-se de uma nomeação, e o serviço tenha sido prestado, sem incidir condenação por improbidade com base no art. 10 da LIA. Ou, da mesma forma, é possível figurar-se uma implicação de ferimento a princípio administrativo, com ilegalidade do ato, mas sem dolo, com o mesmo resultado. Não há razões, então, para obrigar ao litisconsórcio e à cumulação de demandas. Nem para reconhecer no litisconsórcio que seja proposto a condição de unitariedade.
Impõe-se lembrar, ainda, que a conexão de ações é fenômeno de modificação de competência, consoante se verifica no Código de Processo Civil, Capítulo III, Seção IV, só aplicável às espécies territorial e por valor. Lembro o art. 102, segundo o qual “A competência, em razão do valor e do território, poderá modificar-se pela conexão ou continência, observado o disposto nos artigos seguintes”.
A possibilidade de modificação não se estende à competência funcional, que é de ordem absoluta. Nesta matéria, não se admite, tampouco, a aplicação por analogia. Não há aplicação analógica do art. 76, inc. III do Código de Processo Penal, mesmo que o processo de improbidade se aproxime do processo penal, por força da Medida Provisória nº 2.225-45/01, à semelhança do art. 2º, inc. I do Decreto-Lei nº 201, porque não são idênticos; as regras próprias foram traçadas e o Código de Processo Civil tem caráter supletivo, já que se cuida de ação civil, consoante decidido nos tribunais superiores. Se o legislador tivesse querido utilizar a conexão presente no processo penal, art. 76, III, tê-lo-ia expressado.
Nestes casos, quando cumulados pedidos subordinados a distintas competências jurisdicionais, cabe aplicar, por analogia, o entendimento do eg. Supremo Tribunal Federal, por seu verbete nº 170, onde se lê que: “Compete ao juízo onde primeiro for intentada a ação envolvendo acumulação de pedidos, trabalhista e estatutário, decidi-la nos limites da sua jurisdição, sem prejuízo do ajuizamento de nova causa, com o pedido remanescente, no juízo próprio.”
Por outro lado, a ação declaratória de nulidade de contratos submete-se, evidentemente, ao duplo grau de jurisdição, porque, para ela, não há qualquer regra prevendo diversamente. Aí o Município deve ser réu, juntamente com todos os que participaram do ato, em litisconsórcio unitário e necessário, que não foi requerido. Não se está a defender que o duplo grau é sempre necessário, mas só pode ser afastado mediante norma expressa, pena de ferimento aos outros princípios da ampla defesa e do contraditório.
Nem pode a regra que instituiu o privilégio para os Prefeitos e ex-Prefeitos interpretar-se ampliativamente.
É impraticável a cisão posterior, quando os atos decisórios não relativos à improbidade teriam sido praticados com incompetência absoluta e com desobediência ao princípio do juiz natural, desde agora verificado este fato, com omissão da Câmara em providências.
Não vejo, nisso, ferimento ao art. 103 do Código de Processo Civil, independentemente da amplitude que se lhe queira atribuir. Mesmo porque a improbidade, o ato desonesto do administrador, pode ser reconhecido sem que o ato praticado seja nulo.
Neste sentido, já decidiu esta Câmara, nos Agravos Regimentais nos 70006650477 e 70006804678, em 19.8.2003."
(...) (negrito nosso)
Em julgado mais recente, em hipótese idêntica à dos autos, o egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reiterou tal entendimento, consoante ementa a seguir transcrita:
“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO ANULATÓRIA DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO E AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INEXISTÊNCIA DE CONECTIVO PROCESSUAL ENTRE AMBAS (CONEXÃO OU CONTINÊNCIA). INCIDENTE QUE MERECE ACOLHIDA DE PLANO (CPC, ART. 120, PARÁGRAFO ÚNICO, C/C O ART. 557, § 1º-A). CONFLITO JULGADO PROCEDENTE”. (TJRS – Primeira Câmara Cível – Conflito de Competência nº 70057088361 – Rel. Des. Irineu Mariani, j. 22.10.2013)." (negrito nosso)
Enfim, convencido da inexistência de motivos que justifiquem o reconhecimento da conexão requerida pelo réu Sérgio Ricardo de Almeida, o feito deve ser chamado à ordem e revogada a decisão proferida pela Juíza de Direito em Substituição Legal em 15 de fevereiro de 2017 (Ref. 212), na parte que acolheu o pedido de conexão e determinou a reunião das ações civis públicas n.º 59697-55.2014.811.0041 (Id. 949052) e Ação Civil Por Ato de Improbidade Administrativa nº 59959-05.2014.811.0041 (Id. 949403).
No mais, os Réus José Geraldo Riva em 10/02/2017 e Blairo Borges Maggi em 16/02/2017, trazendo aos autos cópia de Agravos de Instrumento, (Ref: 205 e 214, respectivamente) postulam a reconsideração da decisão que recebeu a inicial em face de todos os demandados e que decretou a indisponibilidade de seus bens (Ref: 156), pleitos esses que também não merecem sucesso, pois o quadro fático e jurídico constante nos autos não sofreu alteração alguma que possa justificar mudança do conteúdo da decisão em tela.
Assim, pelo exposto, decido:
a) Chamo o feito à ordem e revogo a decisão proferida em 15 de fevereiro de 2017 (Ref. 212), na parte que acolheu o pedido de conexão e determinou a reunião das ações civis públicas n.º 59697-55.2014.811.0041 (Id. 949052) e Ação Civil Por Ato de Improbidade Administrativa nº 59959-05.2014.811.0041 (Id. 949403);
b) Indefiro a pretendida reunião das ações para instrução única e julgamento simultâneo, devendo a Ação Civil Pública n.º 59697-55.2014.811.0041 (Id. 949052) e a Ação Civil por Ato de Improbidade Administrativa (Id. 949403) tramitarem dissociadamente; e
c) Indefiro os pedidos dos réus José Geraldo Riva (Ref: 205) e Blairo Borges Maggi (Ref. 214), mantendo incólume a decisão proferida por este Juízo em 09 de janeiro de 2017 (Ref: 156).
Intimem-se. Cumpra-se.
Colniza Notícias/Olhar Direto
O que achou? ... comente